agosto 27, 2014

Tempos houve em que o pior presente que eu (e, suspeito, toda a gente) poderia receber era roupa interior. No caso de serem oferecidas meias, o que era frequente, também servia de roupa exterior. Roupa exterior foleira, que tentava esconder a todo o custo, mas visível ainda assim. Esses eram tempos em que pais, avós, tios, primos mais velhos, todos ofereciam roupa interior. "Porque é útil", diziam eles. "Porque nunca se tem de mais e dá sempre jeito", acrescentavam. Pois sim, mas continuava a ser impossível disfarçar a desilusão. A boca sorria, mas os olhos espelhavam a raiva que se reprimia ano após ano a cada mau presente. Havia ainda a versão 'roupa normal', o que também não era bom, mas pelo menos não havia aquele embaraço de olhar para as cuecas retiradas da bolsinha do pack de 4 e ter de dizer "isto não me vai servir" e ter de levar com o olhar de soslaio da tia que nos está a avaliar a cintura e as ancas e a pensar "comesses menos" ou assim.
Ah, a inveja que sentia das minhas coleguinhas, que chegavam à escola depois do seu aniversário/Natal e descreviam pormenorizadamente a amplitude de abertura dos membros da sua nova Barbie. Às vezes, a prenda também era roupa, mas roupa escolhida por elas, o que faz toda a diferença.

Os tempos, contudo, mudaram. Cheguei a um ponto na minha vida em que todas as minhas peças de roupa interior começaram a falhar em simultâneo. As meias estão a ficar esburacadas e demasiado gastas, as cuecas e soutiens estão com os elásticos frouxos.

Não parece grave? Todas as manhãs o meu grande dilema não é "ai, que não sei o que vestir! Não tenho nada no armário e/ou nada me fica bem". Com isso posso eu bem! Não, a minha maior preocupação é encontrar umas cuecas que não se enfiem sistematicamente no rego e um soutien que efectivamente me dê algum suporte, em vez de me fazer duvidar, de cada vez que desço umas escadas, se sequer tenho um vestido. Diria que tenho cerca de meia dúzia de cuecas que ainda não me deixam ficar mal, mas até essas estão a acusar cansaço com o constante uso. Em funcionáriopubliquês, cumpriram 40 anos de serviço, mas ainda têm 63 anos e a reforma parece cada vez mais longe, portanto isto está complicado.

O meu aniversário está quase a chegar e, em gritante contraste com a minha infância, como eu gostaria que todos os meus familiares e amigos se juntassem e me dessem um voucher de 250€ da Oysho para eu me perder em compras de roupa interior. Aliás, já nem peço uma Oysho ou uma Women's Secret. Desesperada como estou, o Continente ou o Jumbo já chegavam.

Acho que não preciso de ser mais clara.

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